terça-feira, janeiro 29, 2008

Apoios a qualquer preço

A 23 de Março, Rodrigo de Abreu, escreve a Raimundo Meira das diligências que tem vindo a fazer no sentido de granjear mais apoios para o lado republicano.

23/3/1915

No correio de hoje seguiram para o directório, registados, os documentos constantes da circular confidencial, os quais requeri à câmara por meu próprio punho. De Coura nada sei por enquanto mas não admira. Estive, como lhe disse com o Manuel Tomás. Não lhe fiz confidências, porque as não faço senão a quem deve ser. O homem diz que os monárquicos não vão às urnas, como também afirmam os mais entendidos. Se forem, diz, têm de perder, se não for a bem é a mal. Eu, diz ele, não sou hoje um político, mas tenho todo o interesse e orgulho em que o nome de meu irmão, que foi sempre republicano, fique ligado à história e só pode ficar salvando a República, pois que a monarquia nunca mais volta. Não tem ligações com partidos e conta com todos os republicanos. Foi a primeira vez que vi aquele homem a falar sem se rir e dizer que dava a sua palavra de honra, que serviria, sem ser político, a República com toda a dedicação. Que estava pronto a receber os republicanos sempre que quisessem e agradecer todos os informes que lhe dessem. A opinião e informe dele é que os monárquicos não vão às urnas, mas são capazes de fazerem qualquer garotice para perturbar, mais nada.
Em resumo. O nosso partido poderá sofrer nesta triste conjuntura que atravessa a República, mas os monárquicos ainda desta não vencem.
Note, eu declarei ao homem logo de princípio, que era republicano acima de tudo mas filiado num partido, o Democrático, cuja orientação e programa acompanhava. Falou-me em si com as melhores referências.
Seria bom vir por cá e abordá-lo também. Em artilharia houve uma festa militar onde oficiais e sargentos fizeram declarações de amor à República. Que pândegos. Pareciam mais republicanos que nós! Estive com o Segismundo.

Seu amigo certo

Rodrigo de Abreu

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domingo, janeiro 27, 2008

O Pânico aumenta

A 18 de Março, Rodrigo de Abreu, informa Raimundo Meira do enorme pânico que grassa em todas as hostes republicanas devido à grande adesão que os monárquicos vêem registando nas suas acções de campanha.

18/3/1915,
São duas horas da noite e chego a casa onde encontro a sua carta. Vou dar-lhe cumprimentos amanhã e por isso hoje fica pronta com a circular dentro, a carta para Coura dirigida ao A.V. para seguir no primeiro correio.
Isto por aqui corre mal se houver eleições. Eu ando a ver se conserto o que posso, mas não vejo as coisas bem.
Os evolucionistas de cá estão descontentíssimos e apavorados com as reuniões monárquicas, bem como com as autoridades e o trabalho eleitoral que têm feito. Amanhã vou terminar uma conferência com Manuel Tomás velho, o qual disse que pretendia ouvir-me sobre as questões monárquicas e sobre os regedores, que eu considero conspiradores. O homem deu a sua palavra de honra ao Ferreira Soares que estava resolvido a combater os monárquicos por todos os processos, embora o irmão lho proibisse, (1) pois só assim seria possível fazer alguma coisa e ele desejava servir o irmão que no presente momento tinha o seu nome ligado a uma missão histórica que havia de honrar a sua família. Ele não era republicano, mas que o irmão sempre o foi e havia de servir a República através de tudo, que podia ter a certeza disso. Este homem é um velhaco mas eu não direi senão o que me convém e ficamos a conhecê-lo mais. O Soares ficou surpreendido com a atitude dele, que não o esperava. Eu avisei desta entrevista apenas o Brandão. O Zé de Abreu trabalha com eles incondicionalmente. O António Carvalho da mesma forma. O Martinho Cerqueira e o Conde de Azevedo recolheram ontem a casa depois das duas horas. O Reimão foi procurado pelo Zé Gatuno em Casa. Por a minha parte estarei sempre firme para tudo o que for possível, nada me apavora, nada me altera, no caminho que devo seguir, sempre pela República, enquanto ela precisar e viver. Mande sempre e se puder apareça. Tenho empenho de ir ao congresso. Vamos a ver se o poderei fazer.
A questão económica é sempre a dificuldade. Leia no Povo a atitude da Câmara. Para os outros mandei indicações idênticas. Dar-lhe-ei conhecimento das démarches junto do Manuel Tomás.

Seu amigo certo

Rodrigo de Abreu

PS: Dê sempre informes de tudo, pois preciso sempre de estar a par de tudo! Homem prevenido vale por dois …
Vai ao Congresso?

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sexta-feira, janeiro 25, 2008

O Pânico democrata

Em Março de 1915, os Democráticos de Viana do Castelo estavam em pânico. Viam conspirações em todos os cantos e esquinas. A perspectiva de umas eleições nas quais todos pudessem votar, afigurava-se-lhes uma catástrofe anunciada. A organização e apoio que pela primeira vez os monárquicos demonstravam, estavam a pôr os cabelos em pé aos partidários de Afonso Costa. Em face disto, era necessário prepararem-se para o pior e vigiar de perto as acções monárquicas.

Viana, 16/3/1915

Meu caro amigo

Ontem houve aqui grande reunião monárquica. Nela estiveram vários conspiradores de categoria. Esteve o Zé gatuno, Luís de Magalhães, Conde de Azevedo, Adolfo Pimentel, Reitor de Caminha, Regos de Caminha, Conde Vitorino, Amândio Lisboa, António Carvalho e outros. O Zé gatuno procurou e falou com o Reimão*.
O Zé de Abreu de Ponte de Lima mandou dizer que estava com os monárquicos ainda mesmo que pelo distrito propusessem o filho.
O assunto que, segundo me informou, foi discutida a questão eleitoral. Resolveram, depois de breve discussão ir às urnas em todos os concelhos onde pudessem ganhar. Onde não fossem disputariam as eleições camarárias e paroquiais.
Participei este assunto ao Governador Civil sem entrar em pormenores, porque não confio nele, e só lhe disse isto, que tinham cá estado estes membros, foi apenas para ver o que ele dizia. Continuam, ao mesmo tempo que preparam estas coisas, a conspirar à bruta, aguardando o momento propício para um movimento pela força armada. Veja se decifra esse papel que aí vai a lápis duns apontamentos que tirei à pressa para uso próprio.
Eu talvez vá ao Porto brevemente. Por aqui tem nomeado conspiradores para regedores. Já estão dois nomeados, um em Santa Marta outro na Meadela.
Não tenho tempo agora para mais. Escreva e conte coisas.

Seu amigo certo

Rodrigo de Abreu


* Malheiro Reimão - Ministro do Governo de João Franco de Castelo Branco

Este é o manuscrito referido por Rodrigo de Abreu, provavelmente copiado de um relatório de uma toupeira que actuava dentro da organização monárquica.

Dia 4 – Rua formosa, 237- Zé de Azevedo, Joaquim Machado, G. Abreu, P. Torres, Luís Magalhães e Reitor de Caminha – Esperam tumultos por ocasião da Reunião do congresso ou o assassinato de Afonso Costa.
Adiamento (das eleições) – Não lhes foram favoráveis as notícias de Lisboa.
Nova Reunião no Porto com O. Lima e Abel Martins Pinto dizendo este – é questão de mais uns dias – Paiva continua na Galiza. Padre Domingos continua em Vigo.
Dia 6 – Às 16 horas, Hotel Universal, Batalha. Vão aliciados falar com Reitor de Caminha por serem chamados. Recomendam vigiar os quartéis para não serem atacados pelos carbonários. Confirmando-se este assalto aos quartéis, devem participá-lo imediatamente aos dirigentes do Hotel Universal para serem avisados grupos e conjuntamente com a polícia assaltarem casas de republicanos e fazerem a anunciada matança.
Dia 8 – Teve uma conferência com D.C. de Menezes.
Dia 9 – Reunião no Hotel Universal com Abel Ferreira, Abel Pereira, Reitor de Caminha e Luís de Magalhães. Este diz "A coisa vai bem. O Pimenta de Castro tem quase tudo na ordem".

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sexta-feira, janeiro 18, 2008

Uma cunha no meio da "barafunda"

Em 15 de Março, Simas Machado recebe mais uma carta de Luís Mesquita de Carvalho, no meio da "barafunda" política em que o país se encontra, a “cunha” para o lugar de Barcelos continua a ser uma preocupação para Simas Machado.

Meu Caro Simas

Obrigado pela amabilidade do seu telegrama; infelizmente não pode você servir-me desta vez.
Não suponha que me esqueci do seu pedido acerca do Dr. Porfírio, de Barcelos. Simplesmente ele veio encontrar-me de cama, onde estive quatro dias com forte dose de gripe. Hoje que já pude levantar-me, procurei falar ao Afonso de Mello (Chefe de Gabinete) pelo telefone; mas, em resposta, informam-me neste momento que ele não está em Lisboa. Se amanhã já me puder levantar (o que não creio) procurá-lo-ei pessoalmente; no caso contrário, voltarei a insistir pelo telefone.
De política nem me anima a falar-lhe. Isto está sendo uma barafunda em que nem o diabo se entende. A atitude do governo é um tanto enigmática e a gente não sabe bem para onde caminha. A ver vamos se isto tomará uma orientação mais firme e decidida. Na minha opinião, não há dúvida que o governo pensa e procura amarfanhar os democráticos; mas onde para mim existe a grande incógnita é em saber se procura auxiliar-nos a nós ou fazer política. Se assim for, resultará no futuro congresso para as direitas um gachis mil vezes pior do que o anterior, de que só poderão sair governos a viverem à mercê de apoios traiçoeiros, sem força própria, sem hegemonia partidária, sem programa definido de reformas: uma embrulhada de lutas de grupelhos e de ambições pessoais, de que afinal resultará cada vez maior o enfraquecimento da Republica e sua lenta agonia.
Deus super omnia. Mas mal irá a inspiração divina se os homens não conseguem entender-se e … ter juízo.
Abraça-o o seu amigo dedicado e obrigado

Mesquita Carvalho
Lisboa. 15/3/1915

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terça-feira, janeiro 15, 2008

A reacção democrática e a Retracção “Moderada”

O Partido Democrático após a publicação da nova lei eleitoral declarou guerra ao governo de Pimenta de Castro.

O Presidente do Parlamento (Manuel Monteiro) é informado por um oficial da Guarda da proibição da abertura do Congresso (Foto de Benoliel)

Estava marcado para o dia 4 de Março uma reunião do Congresso da República (Sessão conjunta das duas câmaras). Nesse dia os deputados e senadores ao chegarem a São Bento viram o edifício cercado por tropas da Guarda Nacional Republica, que impediram o acesso ao interior do Edifício, impossibilitando assim a reunião parlamentar.

Desafiando o governo, Afonso Costa e os seus deputados e senadores, reuniu-se no Palácio da Mitra em São Julião do Tojal, Loures. Acção que os deputados moderados (Unionistas, Evolucionistas e independentes) não secundaram. Mesmo assim o Partido Democrático considerou a reunião como um congresso das duas câmaras mesmo não passando de uma reunião do grupo parlamentar.


Reunião dos parlamentares do partido Democrático na Mitra (Foto de Benoliel)
Nesta reunião, e por unanimidade, o governo de Pimenta de Castro foi considerado “fora-da-lei” e os seus actos legislativos foram considerandos “nulos e sem efeito”. Mais ainda, Afonso Costa, no seu discurso compara Pimenta de Castro a João Franco, dizendo que a "ditadura” de Pimenta era pior, mais indigna e mais infame, rematando o seu discurso dizendo “[…] Não sei que horas sombrias virão, o que sei é que a república vingará”. Tal como Nuno Severiano Teixeira afirma no seu livro “O Poder e a Guerra 1914-1918” - “Se não era o incitamento ao derrube do ditador, era pelo menos uma declaração de guerra à ditadura, que o mesmo era dizer, a ameaça de uma nova revolução”.
Perante esta ameaça de revolução bastaria a Pimenta de Castro o apoio cada vez mais relutante dos moderados e do exército? Não.
Nem os moderados tinham grande poder, nem o exército desejava combater para apoiar Camacho e Almeida, que considerava parte da "Canalha reinante". Por isso Pimenta de Castro voltou-se para outro sector da sociedade que até aí estava legalmente excluído da vida cívica – Os monárquicos.
Pimenta de Castro a coberto de uma politica "Nacional" começou a atribuir cargos a monárquicos, incluindo os membros do Integralismo Lusitano. A 20 de Abril publica uma lei da amnistia a todos os monárquicos e levanta a proibição da constituição de centros e partidos monárquicos. Isto enfurece os republicanos, que não admitiam que a republica pudesse tolerar os monárquicos no seu seio. Com a lei eleitoral de Pimenta de Castro, que diluía o voto urbano (Democrático) no voto rural (Monárquico), com os mecanismos de recenseamento nas mãos do governo, que o queria o mais alargado possível, as eleições estariam ganhas à partida pelos monárquicos.
Com a amnistia Pimenta de Castro perde o apoio dos moderados, com excepção de Brito Camacho, que como não possuía qualquer poder, optou por permanecer ao lado de Pimenta, bem como Machado dos Santos, este último mais por ódio a Afonso Costa, que por apoio às políticas de Pimenta de Castro.

Fontes:
A Republica Velha (1910-1917) Ensaio, Vasco Pulido Valente, Gradiva Publicações Lda. – Lisboa 1997
O Poder e a Guerra 1914-1918 – Objectivos nacionais e estratégicos na entrada de Portugal na Grande Guerra, Nuno Severiano Teixeira – Editorial Estampa Lda. - Lisboa 1996
História de Portugal - Suplemento - Direcção de Damião Peres, Portucalense Editora - Porto 1954

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